No concelho do Bombarral, distrito de Leiria, existe uma pequena aldeia que tem um nome peculiar: A-dos-Ruivos. O nome significa "A Terra dos Ruivos", podendo ter sido contraído a partir de "vou à Terra dos Ruivos" ou de "Vou à dos Ruivos", o que poderia indicar que, neste local, existiriam muitas pessoas de cabelo ruivo.
No nosso país, os ruivos não são muito comuns, contudo, A-dos-Ruivos é uma belíssima aldeia que possui um número anormalmente elevado de ruivos. A explicação está na origem da sua população.
Como é evidente, podemos encontrar algumas pessoas que exibem naturalmente esta cor de cabelo, especialmente no Norte de Portugal, já que esta região acolheu diversas migrações de povos bárbaros ou celtas vindos do norte da Europa.
Mas será que o nome da povoação surgiu realmente devido ao anormal número de pessoas com cabelo ruivo? A resposta é sim! Então, por que razão existe uma elevada concentração de ruivos nesta pequena localidade?
A resposta encontra-se no contexto histórico do povoamento Franco na região, e na genética. No que diz respeito à parte histórica, existem já nos inícios do século XIV registos da presença de Francos nesta aldeia, registos esses que indicavam que estes não estavam de passagem, e que tinham residência fixa na aldeia. Aliás, existe a hipótese de a aldeia ter sido fundada por uma família de origem franca, que terá vindo de um dos senhorios de Atouguia, Lourinhã ou Vila Verde dos Francos.
Os Francos fixaram-se no nosso país e mais tarde, com a passagem dos anos, expandiram-se para novos locais, maioritariamente no sul e centro do país (embora na região mais próxima do Tejo). Existe, pois, a hipótese de o povoado realmente ter sido fundado por Francos, ou, pelo menos, ser morada de vários, que trouxeram o gene ruivo para a população.
Com o passar do tempo, esse gene tornou-se dominante, até porque as deslocações eram difíceis na época e, por isso, as pessoas casavam-se com gente que vivia em locais próximos. Assim, a percentagem de ruivos na aldeia seria ainda maior. Hoje, o gene encontra-se já dissipado, mas existem ainda ruivos em número elevado na zona.
Para além do seu nome peculiar, A-dos-Ruivos tem muita história documentada. As notícias do século XIV que chegaram aos dias de hoje caracterizam esta aldeia como sendo essencialmente agrícola, contando com hortas, pomares, searas, e com terras especialmente aptas para vinha. Assim, não é de admirar que as terras fossem bastante disputadas por instituições religiosas, como o Mosteiro de Alcobaça, a Abadia de Santa Clara de Coimbra, a Igreja de Santa Maria de Óbidos e até mesmo a Igreja de S. Pedro do Carvalhal.
Graças ao solo rico para vinha, a aldeia contava com lagares e adegas bem guarnecidas de equipamentos. Tinha também o seu porto, conhecido por Porto da Ribeira ou Porto da Ribeira da Várzea. Nele, o ribeiro desaguava no rio Bogota.
Sabe-se que em 1337 a população fundou uma confraria e uma albergaria, o que denuncia a grande passagem de peregrinos e caminhantes pela zona. Esta obra de cariz assistencial foi chamada Albergaria e Confraria do Espírito Santo de A-dos-Ruivos.
Já em 1527, conseguimos encontrar em A-dos-Ruivos uma grande variedade de profissões, o que indica prosperidade no local. Pode-se destacar a presença de sapateiros, alfaiates, oleiros e até vassalos do monarca (ou seja, pessoas contempladas com rendas reais).
No final do século XIV, a aldeia possuía já uma Igreja dedicada a Santa Catarina. Junto à Igreja, encontrava-se o Rossio, de uso comunal, onde os moradores costumavam largar o gado e onde se realizava, uma vez por ano, uma feira de grande importância económica, sendo ponto de encontro de mercadores e comerciantes da região no dia de Santa Catarina. Existem também relatos de uma fonte, com o nome de "Fonte Boa" ou "Fonte Santa".
Mais recentemente (século XIX), esta povoação foi retratada pelos escritos de Júlio César Machado, no livro "Serões na Aldeia", já que aí tinha uma casa onde passava os seus tempos livres. Em sua homenagem, a população erigiu-lhe um busto junto à capela local.
A-dos-Ruivos está apenas a uma hora de distância de Lisboa (78km) pela A8, pelo que merece bem um passeio de fim de semana.
Fonte: National Geographic
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