"No dia 1 de Dezembro de 1640, terminou o período de 60 anos em que o Reino de Portugal, foi governado pela dinastia Filipina dos Habsburgos (de origem austríaca) , com o fim do reinado de D. Filipe III (conhecido em Espanha por Felipe IV). Esta dinastia, ficou conhecida em Portugal por Filipina, porque todos os monarcas se chamavam Filipe.
Quando em 1578 sob o comando do rei D. Sebastião, Portugal foi derrotado na batalha de Alcácer Quibir, ficou sem rei ou sucessor ao trono. Durante dois anos o trono português foi ainda ocupado pelo Cardeal D. Henrique. Mas, os direitos de Filipe II de Castela (este monarca Habsburgo era primo de D. Sebastião e portanto neto de D. João III) por um lado, e o seu dinheiro por outro, levaram a que grande parte da nobreza portuguesa aceitasse o domínio de um rei estrangeiro.
A monarquia dos Habsburgo controlava inúmeros estados, todos eles separados entre si. Portugal não era diferente da Catalunha, da Flandres, de Castela, de Navarra, de Nápoles ou de Valência, mas cada um desses países, era independente dos outros.
A completa separação destes estados, "unidos" uns aos outros por ténues laços, era considerada o grande "calcanhar de Aquiles" da monarquia, e acabaria por ser a principal razão da sua decadência.
Para evitar a continua fricção entre os vários reinos, principados, e regiões, a solução passava pela submissão de todos eles a um único rei com um único governo. Isso levou a que se iniciasse uma politica de centralização administrativa, que entrava em conflito com os direitos jurados pelo monarca em cada um dos reinos da coroa. No caso português, nas cortes de Tomar de 1581, D. Filipe I (Felipe II em Castela), prestou juramento como rei de Portugal, mas o seu neto, Filipe III (Felipe IV de Castela) fez letra morta do juramento do seu avô. Do ponto de vista jurídico, ao violar o juramento que Filipe I tinha feito em 1581 perante as cortes de Tomar, Filipe III perdeu a legitimidade para governar Portugal, legitimidade essa que dependia do cumprimento das obrigações a que se tinha obrigado por juramento.
Quando em 1640 os nobres portugueses, muitos deles desiludidos com o não cumprimento das promessas dos monarcas decidem revoltar-se, não tomam uma decisão original. Na verdade, nesse mesmo ano de 1640, durante o Verão, um outro país da península ibérica decidiu revoltar-se contra exactamente o mesmo estado de coisas e expulsar a família real dos Habsburgo. Foi o caso da Catalunha.
A monarquia hispânica está envolvida na chamada guerra dos trinta anos e se não tem na altura, meios eficazes para esmagar a revolta na Catalunha, muito menos os tem, para debelar a revolta em Portugal.
Para debelar a revolta da Catalunha, o monarca espanhol manda que se mobilize a nobreza dos restantes reinos, especialmente a portuguesa, com o objectivo de atacar os catalães.
A ordem de mobilização chega a 24 de Agosto, e todos, mesmo D. João II, Duque de Bragança deveriam comparecer perante o rei. Em Portugal os nobres recusam-se e pressionam o mais rico e influente representante da nobreza portuguesa - exactamente o Duque de Bragança - para que aceite chefiar uma revolta, para voltar a colocar um monarca português no trono em Lisboa, terminando assim o período de União Ibérica.
Os nobres tiveram todas as cautelas para não transformar a revolução de 1640 numa revolução de cariz popular. O golpe teria que ser dado, e só depois disso se deveria informar o povo de Lisboa, quando a situação já estivesse sob controlo.
Assim ao despontar do dia 1 de Dezembro de 1640, entram no palácio real cerca de 40 nobres portugueses, conhecidos pelos «conjurados», que rapidamente controlam a guarda. Procuram o secretário de estado, Miguel de Vasconcelos, cuja morte tinha sido inicialmente determinada. Executam-no, e obrigam pela força a duquesa de Mântua a ordenar a rendição das forças fieis ao monarca Habsburgo, no castelo de São Jorge e nas fortalezas que defendem o rio Tejo, a torre de Almada e a torre de Belém.
Só por volta das 10:00 horas da manhã é que o povo de Lisboa tem conhecimento do sucedido, e que o duque de Bragança será o novo Rei de Portugal. Embora guiada e conduzida pela nobreza portuguesa, a revolução tem uma aceitação total. Em todo o país quando se conhece a boa nova da destituição da duquesa e do fim do domínio dos Habsburgos, há movimentações de regozijo. As várias cidades do país declaram o seu apoio a D. João IV em poucos dias.
O duque de Bragança só chega a Lisboa no dia 6 de Dezembro para ser aclamado rei, com o título de D. João IV. Nas duas semanas que se seguem - todo o país - nobres e municípios, se declaram por D. João IV, sem que seja disparado um único tiro.
Quando a notícia começa a chegar ao reino de Castela, os nobres portugueses que se encontravam em Madrid, dividem-se em dois grupos. Uma parte junta os seus haveres e volta para Portugal, outra parte acabará por preferir as vantagens e o dinheiro que a sua presença na corte madrilena lhes davam, não retornando a Portugal e mesmo lutando contra a independência do seu próprio país.
A situação de Portugal em 1640, era de absoluta miséria. O dinheiro que 60 anos antes se esperava viesse de Madrid, para ajudar a recuperar uma economia mal gerida e infestada pela administração corrupta no tempo de D. Sebastião e seus antecessores, nunca se materializou e o «Hispanismo» deixara o país numa crise sem precedentes.
O país estava decrépito e decadente e à beira da ruína. No entanto, contra todas as expectativas, contra muitas previsões e contra a própria lógica, o país resistiu e ainda hoje é difícil entender como o conseguiu fazer. Embora a historiografia espanhola tenha criado o mito do apoio dos ingleses a Portugal, esse apoio nunca passou de um mito".
Excertos de: "Diálogos Lusófonos"
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