Em famílias sem herdeiros masculinos, uma das filhas era educada para suceder ao pai no comando de tudo o que à família dissesse respeito.
Em vias de extinção, esta estratégia era usada para manter a honra ou garantir a sucessão de famílias sem filhos varões, e teve lugar em regiões isoladas do norte da Albânia e também, pontualmente, no Montenegro, Kosovo e Macedónia.
Se uma mulher não quisesse casar com o homem a quem havia sido prometida, tinha como "saída" a conversão à personalidade masculina. Seria a única maneira, de preservar a honra da família do pretendente preterido, sem o que se instalaria uma "rixa de sangue" com baixas sucessivas de lado a lado.
Como até cerca de 1920, cerca de 30% da população masculina adulta do país (região) perecia em "rixas de sangue" - honra a todo o custo - o "deficit" de candidatos a chefes de família foi o principal catalisador da existência das "burneshas". O que costumava ser um uma tradição comum no século XV ainda permanece viva em algumas áreas rurais do norte da Albânia.
Desde há alguns anos, que os albaneses vêm questionando o carácter de "atração de circo" que recai sobre estas mulheres (das quais, atualmente se estima que existam cerca de 60, de um modo geral, idosas) e aborrecem-se com a atenção dada a este arcaísmo fora do seu contexto.
O fotógrafo Jill Peters fotografou algumas "burneshas" - mulheres albanesas que decidiram por iniciativa própria viver como homens, ou que tiveram que assumir essa identidade por mando da família.
Jill explica: "A liberdade de votar, dirigir, ter um negócios, ganhar dinheiro, beber, fumar, possuir armas ou vestir calças era tradicionalmente da competência exclusiva dos homens. As meninas eram comumente forçadas ao matrimónio em casamentos arranjados, muitas vezes com homens muito mais velhos de aldeias distantes. Como alternativa, elas poderiam fazer o voto de virgindade, se tornando "burneshas", o que elevava a mulher à condição de homem e lhe concedia todos os direitos e os privilégios exclusivos da população masculina". (...)
(...) "A fim de manifestar a transição, as mulheres deveriam cortar o cabelo, passar a vestir roupas masculinas e às vezes até mudar de nome. As atitudes e os gestos masculinos eram praticados por elas até se tornarem naturais.
E o mais importante de tudo: as burneshas deveriam fazer um voto de celibato e permanecer castas por toda a vida. "Ela" tornava-se "ele". Esta prática ainda hoje continua, mas com o avanço da modernização em direção às pequenas aldeias, esta tradição arcaica é cada vez mais vista como obsoleta. Apenas algumas "burneshas" mais velhas permanecem".
Jill também verificou que estas mulheres são muito respeitadas nas suas comunidades: "Elas possuem uma quantidade indescritível de força e orgulho, além de honrarem a família acima de tudo. A sua transição absoluta é totalmente aceite sem questionamentos pelas pessoas com quem convivem. Mas o mais surpreendente é que não se arrependem da escolha que fizeram, apesar dos inúmeros sacrifícios pelos quais passam".
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