sábado, dezembro 28, 2019

Doña Anita

Oiça Patxi Andión, recentemente desaparecido em Doña Anita (1970).
Patxi Andión era um cantor, compositor, actor, professor e escritor, de origem basca, nascido em Madrid, que tinha uma estreita relação de amizade com Portugal.

Setenta y tres años y un vestido añil,
un hermano cura y un primo en París.
Desborda sus labios con fuerte carmín
Anita, el rosario... un poco de anís?

Bajo el colorete
oculta el tiempo ya perdido
y se prepara a dar carrete
a algún enfermo afligido.

Y baja la escalera
moviendo el sombrero florido
que junto con ella espera
hasta que caiga el telón.

Saluda a Don Julio, que es muy parlanchin,
setenta y dos años,
Letra: Patxi Andion
Compositor: Rafael Ferrero

sexta-feira, dezembro 27, 2019

A Sericaia ou Sericá

A Sericaia é um doce que, ultimamente, se serve com as Ameixas d’Elvas (em compota).
A Sericaia é um doce da região portuguesa do Alentejo, provavelmente de origem indiana, também conhecido por Sericá ou Cericá. Tem marcas da doçaria conventual, porque há a utilização abundante de ovos, açúcar e canela.
A sericaia terá tido origem no Convento das Chagas de Vila Viçosa. Contudo, este doce terá passado a confecionar‑se de outra forma, em Elvas, no convento de Nossa Senhora da Conceição ou no de Santa Clara, tendo‑se-lhe então adicionado a canela. Mas há quem afirme que a receita terá sido trazida das Índias por D. Constantino de Bragança, após a conquista de Malaca em 1510. Desde há algum tempo, é comum acompanhá-la com Ameixas d’Elvas, facto frequentemente contestado pelos gastrónomos puristas, que defendem a sua apresentação original.
De acordo com Câmara Cascudo este doce foi levado para o Brasil pelos portugueses, na época da colonização. Segundo um texto escrito por este antropólogo, na década de 1960, a sericaia era popular no Brasil, no entanto, diversas versões alteraram a receita original. Cascudo descreve ainda no seu texto três versões do doce no Brasil: uma em Pelotas (RS), baseada no livro Doces de Pelotas (Porto Alegre, 1959), de Arminda Mendonça Detroyat; outra, na Bahia e outra em São Paulo. Para Cascudo, a receita de Pelotas era a que mais se aproximava da original que foi perdida.
Se quiser experimentar este doce no Ano Novo ou recuperar a receita, aqui vai ela:
Ingrediente:
1 l de leite
12 ovos
125 g de farinha (sem fermento)
500 g de açúcar
1 casca de limão
1 pau de canela
canela em pó (cerca de 2 colheres de sopa)
Sal (qb)

Preparação:
Batem‑se as gemas com o açúcar até se obter um creme fofo. À parte dissolve‑se a farinha com o leite, que foi previamente fervido com o pau de canela, a casca de limão e o sal.
Adiciona‑se o creme de gemas e açúcar e mexe‑se. Leva‑se a engrossar sobre lume brando até se ver o fundo do tacho.
Retira‑se do calor e deixa‑se arrefecer. Batem‑se as claras em castelo e juntam‑se cuidadosamente ao preparado anterior. Nessa altura, o creme deverá estar frio ou ligeiramente morno.
Num prato de estanho ou barro (que possa ir ao forno, previamente aquecido), deita‑se o doce às colheradas desencontradas, isto é, uma ao alto e outra ao atravessado. Este aspeto é muito importante.
Polvilha‑se abundantemente com canela (deve ficar bem castanho) e leva‑se a cozer em forno muito quente (mais ou menos 40 minutos). O doce deverá abrir fendas ao cozer, e abaterá ao arrefecer (como pode ver nas imagem acima).

quinta-feira, dezembro 26, 2019

O Magusto da Velha em Aldeia Viçosa

O Magusto da Velha ocorre  a 26 de dezembro, em Aldeia Viçosa (Guarda).
Esta celebração, com 320 anos, acontece em memória de uma idosa abastada (Velha), cujo nome se desconhece, que decidiu doar castanhas e vinho aos habitantes da aldeia em troca de uma oração em seu nome, durante o Natal.
Agora, todos os anos, no dia a seguir ao Natal, as pessoas da Aldeia Viçosa vão à praça da igreja e sobem à torre da mesma.
Uma vez lá em cima, devem atirar castanhas (cerca de 150 kg) aos restos da fogueira do Madeiro que ardia na praça no dia anterior.
A Câmara Municipal oferece o vinho e todos comem castanhas assadas e passam a tarde, contando histórias de natais passados.

quarta-feira, dezembro 25, 2019

O Menino Jesus da Cartolinha

O Menino vestido com a capa de honras
tradicional de Miranda do Douro 
Menino Jesus da Cartolinha ou Nino Jasus de la Cartolica, assim é chamada, respetivamente em português e em mirandês (as duas línguas oficiais de Portugal), uma imagem do Menino Jesus que está na Sé Catedral de Miranda do Douro.
A imagem não é muito antiga. Deve datar dos finais do séc. XVII ou já do séc. XVIII. A cartola, que ela habitualmente ostenta e que lhe dá um aspeto ingénuo, é ainda mais recente, pois, no tempo em que a imagem foi feita ainda não se usavam cartolas. A cartola, portanto, é dos finais do séc. XIX ou mesmo do séc. XX.
Outro aspeto que caracteriza esta imagem é o seu enxoval, constituído por peças de roupa miniaturais que as gentes de Miranda têm oferecido ao Menino ao longo dos tempos.
Ao Menino Jesus da Cartolinha está associada uma lenda que não é muito mais antiga do que a imagem.
"A lenda vem do período de 1706 a 1713. Foi neste tempo, mais concretamente, em 1711 que o exército castelhano invadiu Miranda e a assolou durante vários meses.
Quando a cidade se encontrava invadida, saqueada e vexada pelos castelhanos e sem esperança de remissão, esperando o reforço das nossas tropas que nunca mais chegava, aparece nas muralhas um menino vestido de fidalgo cavaleiro chamando os mirandeses e gritando às armas contra os invasores. De todas as casas sai gente armada de foices, gadanhas, espingardas e varapaus para escorraçar os espanhóis.
À frente dos mirandeses o menino ora aparecia ora desaparecia, até que no fim da luta e depois da cidade libertada o menino não mais se viu. Procuraram-no por toda a parte, mas em vão. O pequeno "General" tinha desaparecido. Os mirandeses consideraram que se tratava de um autêntico milagre esta vitória contra os espanhóis e que foi sem dúvida um favor muito grande do Menino Jesus.
Mandaram então esculpir uma imagem do Menino Jesus vestido de fidalgo cavaleiro, à maneira do tempo e colocaram-no num altar da catedral."

terça-feira, dezembro 24, 2019

Loa Alentejana

Menino Jesus (Convento de Sta Cruz do Buçaco)
"Loa Alentejana" é o nome dado por Jorge Croner de Vasconcelos a uma canção de Natal tradicional portuguesa originária de Évora: "Eu hei de dar ao Menino".
O texto desta cantiga eborense, comum a outras cantigas de Natal alentejanas, é datado do século XVIII.

Em 1974, a "Loa alentejana" foi harmonizada pelo compositor português Jorge Croner de Vasconcelos que a incluiu como um dos seus Oito Cantos do Natal, dando-lhe a designação por que é conhecida.
A cantiga não apresenta um tema definido, embora todas as coplas girem em torno do conceito de presentear o Menino Jesus (com "uma cadeirinha de oiro", "uma fita pró chapéu", "uns sapatinhos" e um "laço verde") em troca de um "lugarzinho no Céu" ou a cura "duma doença".



Eu hei de dar ao Menino;
Ao Menino eu hei de dar:
Uma cadeirinha de oiro
Para no Céu se sentar.

Eu hei de dar ao Menino
Uma fita prò chapéu,
Também Ele me há de dar
Um lugarzinho no Céu.

O Menino da Senhora
Chama pai a São José,
Que lhe trouxe uns sapatinhos
Da feira de Santo André.

— Ó meu Menino Jesus,
Quem te deu o laço verde?
— Foi uma moça donzela
Duma doença que teve.

segunda-feira, dezembro 23, 2019

Os Caretos de Varge

Os Caretos de Varge fazem parte da Festa dos Rapazes de Varge.
Esta é uma das principais expressões das tradições transmontanas do Solstício de Inverno que envolvem os Caretos, e realiza-se na icónica aldeia de Varge, localizada no Parque de Montesinho, no nordeste transmontano.
Seguindo a tradição, os rapazes solteiros da aldeia reúnem-se no dia 24 de Dezembro para preparar tudo para o dia de Natal. No dia 25 de dezembro, correm pela aldeia vestidos de Caretos, com máscaras pagãs, dando saltos, gritando e provocando os habitantes para criar o caos e espalhar a boa nova de que o frio está a desaparecer e que todos podem sair e divertir-se novamente.
No meio de tudo isto, cantam "loas", canções que ridicularizam e criticam os aldeões e os seus costumes, e vão de casa em casa, comendo as oferendas dos habitantes que abrem as suas portas. No final do dia acontece uma corrida que termina com um jantar e um baile, onde os rapazes e as raparigas de Varge se reúnem numa união simbólica.

domingo, dezembro 22, 2019

Loas Cantadas No Natal

 As Loas que se seguem inserem-se na longa tradição das representações que tinham lugar por alturas do Natal, no nosso país.

Senhores deste santuário
Aqui na vossa presença,
Agora que estou cá dentro
Quero-vos pedir licença.

O Senhor reverendo abade
Está na sua cadeira
Quero-lhe pedir licença
Para seguir minha carreira.

Minha carreira é pequena
Eu tenho fraca memória
Todo o meu desejo é ver
O divino rei da glória.

Deus lhe dê alegres noites
Senhores que estão cá dentro
E segui-me se sabeis
Que razão mudou o tempo.

Pois de certo vos já digo
Que temos o tempo mudado
Em que já vi sinais
De o mundo ser acabado.

Acabará um só dia
Porque assim está prometido
Ele já foi sentenciado
Pelo dia de juízo.

O mesmo nosso pai Adão
Porque o mundo foi girado 1
Pois ele é do mesmo número
A juízo será chamado.

Não vos lembreis mulheres
Por eu de vós não ser lembrado
Saístes do lado do homem
Estais sugeitas ao pecado.

Então vereis cair los outeiros
Quebrar suas espinhas duras
Resumindo-se os rochedos
Abrirão-se as sepulturas.

Vereis abrir o céu
E o estandarte real
Baixando o sol e a terra
O Messias devinal.

Todo o mar há-de dar fundo
Sem água há-de ficar
Para formar novo corpo
Que nele forem sepultar.

Se me concedem licença
Descansarei nesta jornada
Para tomar algum alívio
Tomarei uma pitada.

Torno a continuar
Por esta estrada dura
Vou dizendo palavras
Da sagrada escritura.

Os rústicos não me entendem
O meu modo de falar
Entenderam-me os eclesiásticos
Que o sabem pronunciar.

EMBAIXADOR
Entrai donzelas, entrai
Por essas portas a dentro
Ide cantando louvores
Ao sagrado nascimento.

O sagrado nascimento
Que desculpa lhe darei
Deitei-me e adormeci-me
Ainda agora acordei.

Donzelas
Já chegámos à igreja
Já nos mandaram entrar
Já daqui se deixa ver
Aquele rei celestial.

Já se as portas à igreja
Já se as portas vão abrindo
Para falar à senhora
Licença vamos pedindo.

A estrela mais brilhante
Vede-la aí está entre velas
É a flor da castidade
Que vem chamar-las donzelas.

PRIMEIRO EMBAIXADOR
Se o eco me não responde
Certamente estou perdido
Não acho meu companheiro
Que responda o que eu digo.

SEGUNDO EMBAIXADOR
Anda cá ó companheiro
Anda cá para diante
Que eu também vou para Belém
Desejo ser viajante.

Responde o primeiro:
Eu também da mesma sorte
Desejo levar companha
Por temer as bravas feras
Que existem nesta montanha.

O segundo:
Também nas eu temerei
Que a noite está muito escura
Não esperemos pelo dia
Teremos melhor fortuna.

PRIMEIRO
A noite está muito escura
Meu inocente Jesus
Eu daqui não mudo os pés
Sem me mandar uma luz.

SEGUNDO
Mandai-nos um anjo do céu
Que nos venha alumiar
Que eu não vejo a estrada
Por onde caminhar.

O anjo com a luz:

Aqui tendes esta luz
Eu serei o vosso guia
Vamos ver a Jesus Cristo
Filho da virgem Maria.

Andai comigo meninos
A dar lo vosso recado
Vamos ver o deus menino
Numas palhinhas deitado
Jesus Cristo feito homem
E destruidor do pecado.
Fonte: Loas cantadas no Natal - Centro de Estudos António Maria Mourinho e António Bárbolo Alves, 2007