sábado, março 27, 2021

Samba Invertido

Oiça o cantor brasileiro Luca Argel em Samba Invertido (a música é de Luca Argel, o vídeo de  Ana)  Clara Nunes Roberti) numa criação coletiva com as crianças do T.E.I.A.

Luca Argel é um cantor e compositor brasileiro radicado em Portugal, desde 2012. É mestre em Literatura pela Universidade do Porto. 

É vocalista e compositor dos grupos Samba Sem Fronteiras e Orquestra Bamba Social, com quem divide a alegria de difundir a sonoridade e poesia da música brasileira em Portugal.

Tem livros de poesia publicados no Brasil, Espanha e em Portugal. 

ontem saí de casa às duas
e ao sentir o chão das ruas
tocar os meus pés
eu percebi contrariado
que havia algo errado
o mundo estava ao revés!

surpreso eu contei até dez:
um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito...

e antes de chegar ao nove
do meu lado algo se move
era um fundo sem buraco
onde uma casca escorregou
e a banana que sobrou
estava comendo um macaco
- eu quase tive um pirepaco!

quando cruzei a avenida
e vi uma vaca encolhida
que mamava em seu bezerro
(como um jogo dos sete erros)
um réu condena um juiz
por um comentário infeliz
a sete anos de degredo
(lá na ilha do desterro)
e cada degrau que eu pisava
tinha mais de cem escadas
e ninguém pra dar socorro
e na pelada lá do morro
era defesa no ataque
a bola chutava o craque
e o poste mija no cachorro
- eu depois dessa quase morro!

saí correndo dali
e sem querer eu me meti
no salão de beleza
(onde trabalha a Teresa)
que ao ouvir minha aventura
não me fez qualquer censura
nem me pareceu surpresa
apenas disse com franqueza:
"por favor tenha calma"
e me trouxe um gole d'água com o copo dentro
mais uma pedra de gelo
depois cortou-me as cabeças do cabelo
e os narizes do pêlo
(passando a agulha no camelo)
eu afinal me conformei
virei pra ela e falei
- se é assim, que assim seja!

fui ao boteco do Garcia
e passei o resto do dia
sendo sorvido por cerveja
(e que o perigo nos proteja!)
 

sexta-feira, março 26, 2021

A Camisola Poveira

A camisola Poveira faz parte do traje tradicional da Póvoa de Varzim, em Portugal.

É uma camisola de lã branca (originalmente poderia ser branca, castanha ou azul), bordada em ponto de cruz, com motivos em preto e vermelho. Os motivos do bordado são não só marinhos (patinhos,  remos cruzados, vertedouros, grinaldas, apetrechos marítimos, etc), mas também incluem o escudo nacional, com a coroa real, o brasão da Póvoa de Varzim e siglas poveiras.  O remate com o nome ou a sigla poveira era mais do que um registo de propriedade, era também uma dedicatória.

As camisolas poveiras foram inicialmente bordadas por homens - os velhos "Lobos do Mar" retirados da faina, que esculpiam na lã toda a simbologia da sua vida. Depois passaram a ser bordadas a ponto de cruz pelas noivas, irmãs ou mães dos pescadores, como sinal de afeto. 

Esta peça era elemento integrante do traje masculino de romaria e festa do pescador poveiro, cuja origem remonta ao primeiro quarteirão do séc. XIX. Este traje branco de branqueta (tecido manual) foi o que mais perdurou, mantendo-se até finais do século passado, sendo sempre o traje escolhido aquando da presença de elementos da comunidade junto das mais altas individualidades do país. Com a grande tragédia marítima de 27 de Fevereiro de 1892, o luto decretou a sentença de morte deste traje branco, assim como de outros trajes garridos. A camisola sobreviveu, ainda, pela primeira metade deste século, mantendo-se como peça de luxo de velhos e novos.

Foi com a criação do Grupo Folclórico Poveiro, em 1936, pelo etnógrafo António dos Santos Graça, que se assistiu ao renascimento do traje branco (de romaria e festa), onde a camisola poveira tem posição de relevo, e se iniciou a divulgação no exterior desta peça de extrema beleza e a quantos visitam a Póvoa de Varzim, quer nacionais quer estrangeiros. 

Atualmente, as Camisolas Poveiras vendem-se, como peças de artesanato, nas lojas de recordações turísticas.

Nestes dois últimos dias muito se tem falado da Camisola Poveira, no nosso país. Não pelos melhores motivos. 

Uma marca norte-americana (a Tory Burch) vende a camisola poveira (como sendo de design próprio) por 695 euros, sem qualquer referência à Póvoa de Varzim ou a Portugal. Segundo os jornais Público e Observador, a marca começou por apresentar a camisola como sendo de inspiração mexicana.

quinta-feira, março 25, 2021

Meu Amor da Rua Onze: Agora a Canção

Oiça o cantor  angolano Toty Sa'Med em Meu Amor da Rua Onze, um poema do poeta angolano Aires de Almeida Santos.

Aires de Almeida Santos (1922 - 1991) foi um poeta e jornalista angolano que nasceu no Chinguar (Angola),  e viveu a sua infância junto do mar, na cidade de Benguela e a adolescência na cidade do Huambo.

O músico dos Buraka Som Sistema produziu o primeiro EP de Toty, Ingombota, quando era um cantor praticamente desconhecido.

Nesse disco, o músico angolano cantou velhas canções de Ruy Mingas, Artur Nunes ou Bonga. Em 2018, subiu ao palco do EDP Cool Jazz, fazendo a primeira parte do espetáculo de Salvador Sobral. 

Joss Stone procurou-o na sua passagem por Angola com o projeto Total World Tour. E cantou com ele, em kimbundu.

quarta-feira, março 24, 2021

Meu Amor da Rua Onze

Tantas juras nós trocámos,

Tantas promessas fizemos,

Tantos beijos nos roubámos

Tantos abraços nós demos.


Meu amor da Rua Onze,

Já não quero

Mais mentir.

Meu amor da Rua Onze,

Meu amor da Rua Onze,

Já não quero

Mais fingir.


Era tão grande e tão belo

Nosso romance de amor

Que ainda sinto o calor

Das juras que nós trocámos.


Era tão bela, tão doce

Nossa maneira de amar

Que ainda pairam no ar

As vezes promessas, que fizemos.


Nossa maneira de amar

Era tão doida, tão louca

Qu´inda me queimam a boca

Os beijos que nos roubámos.


Tanta loucura e doidice

Tinha o nosso amor desfeito

Que ainda sinto no peito

Os abraços que nós demos.

E agora

Tudo acabou

Terminou

Nosso romance

Quando te vejo passar

Com o teu andar

Senhoril,

Sinto nascer

E crescer

Uma saudade infinita

Do teu corpo gentil

de escultura

Cor de bronze

Meu amor da Rua Onze.

Aires Almeida Santos (1922 - 1991) - "Meu Amor da Rua Onze" (1987).

terça-feira, março 23, 2021

Paisagens de Angola

Para os amantes de Angola, aqui fica um vídeo com maravilhosas paisagens de Angola.

A República de Angola, é um país da costa ocidental da África, cujo território principal é limitado a norte e a nordeste pela República Democrática do Congo, a leste pela Zâmbia, a sul pela Namíbia e a oeste pelo Oceano Atlântico. Inclui também o exclave de Cabinda, através do qual faz fronteira com a República do Congo, a norte. Para além dos vizinhos já mencionados, Angola é o país mais próximo da colónia britânica de Santa Helena.

Não perca mais este passeio virtual a este belo país africano.

Ora veja.

segunda-feira, março 22, 2021

Maria Maddalena

 O "Capture-me como faria Rembrandt" é um grupo nas redes sociais onde as pessoas publicam cosplays de obras-primas.

O conteúdo é criado pelos seguidores que enviam as suas fotografias no estilo de pinturas e esculturas. Algumas pessoas tentam repetir os detalhes das obras com precisão enquanto outras fazem isso usando o humor. O resultado é, pois, sempre surpreendente. 

Aqui lhe deixo hoje mais um cosplay, desta vez o de "Maria Maddalena", de Giovanni Bellini.

Giovanni Bellini (1430 - 1516), foi um pintor do Renascimento. O mais famoso de uma família de pintores com o mesmo sobrenome. Era cunhado e amigo de Mantegna e teve Tiziano entre os seus aprendizes. É considerado como renovador da pintura da escola veneziana, levando-a para um estilo mais sensual e policromático. Pelo uso de cores claras de lenta secagem, Bellini criou sombras detalhadas, profundidade e ricos coloridos. As suas coloridas paisagens tiveram um grande efeito no seu tempo.

domingo, março 21, 2021

Quando vier a Primavera

Quando vier a Primavera,

Se eu já estiver morto,

As flores florirão da mesma maneira

E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.

A realidade não precisa de mim.


Sinto uma alegria enorme

Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma.


Se soubesse que amanhã morria

E a Primavera era depois de amanhã,

Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.

Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?

Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;

E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.

Por isso, se morrer agora, morro contente,

Porque tudo é real e tudo está certo.


Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.

Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.

Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.

O que for, quando for, é que será o que é.

7-11-1915 - "Poemas Inconjuntos"-Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa.